As dificuldades no Brasil são plantadas a partir de uma herança intervencionista monarquista, com o objetivo essencial de “vender indulgências”. Mas os tempos são outros e o resultado só pode ser uma abundante colheita de problemas.
A Folha de São Paulo, definitiva e comprovadamente um dos veículos mais alinhados com o governo federal, publicou uma informação impressionante: a governanta do Brasil concedeu desde 2011 a bagatela de R$458 bilhões em desonerações fiscais.
O dado foi apurado por auditores da Receita Federal, portanto, merece algum crédito e inclui interessantes dados como, por exemplo, o tipo de produtos beneficiados, que vão de automóveis a queijo do reino, passando por móveis, máquinas de escrever em Braille e investimentos financeiros.
É claro que a justificativa é sempre a de intervir positivamente na economia de forma a evitar ou reduzir o impacto dos movimentos negativos do mercado, no que costumamos chamar de “intervenções anti-cíclicas”.
Para começo de conversa, considerando o estado geral da economia, é óbvio perceber que algo não funcionou bem.
Mas a despeito do desastre geral, algumas declarações, inclusive de empresários como foi o caso do presidente do Itaú, ainda defendem a manutenção da estrutura.
Aí entra a segunda questão, que é o tema deste texto: as desonerações, assim como tantos outros mecanismos de exceção, servem para dominar os agentes econômicos e mantê-los sob controle, exigindo um relacionamento estreito com o poder político.
Desde a monarquia as isenções sempre foram consideradas uma espécie honraria, um atestado de proximidade com a realeza.
A nobreza não pagava impostos, o que era visto como a prova do bom relacionamento com o Rei. Isso se justificava pelo fato de que seria ela – a nobreza – que defenderia o povo em caso de guerra, o que evidentemente era uma balela. Data dessa época também a isenção tributária do clero, o que deixava o povo, a plebe rude e ignara, com a obrigação de pagar o necessário para garantir-lhes a vida fausta.
Vivemos no Brasil, portanto, um sistema tributário monárquico-feudal. O Presidente-Rei estabelece quem são seus amigos, justificando à plebe o tratamento especial, como o que acaba de acontecer com a indústria automotiva.
Eu não defendo o aumento da carga tributária, evidentemente, mas é óbvio que, ao privilegiar um ou outro setor, o governo passa a manter com ele uma relação que, embora legal, é imoral. É uma espécie de “mensalão” ao contrário ou, como diriam alguns, um “cala-boca”.
Não vejo a menor possibilidade de mudar a essência das relações entre o poder público e o setor privado enquanto as regras tributárias não forem claras e simples.
É natural, portanto, que sejam poucos os que lutam pela simplificação do sistema tributário. A maioria de nossos empresários – e políticos – ainda defende um tratamento preferencial, não percebendo que é nele que reside a essência da corrupção.
É o momento de pensar sobre o que queremos: liberdade e estabilidade para empreender ou a tutela instável do Estado.